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ACERCA DOS “PERITOS INDEPENDENTES” E O MINISTÉRIO DA JUSTIÇA


Foi vinculada na imprensa, na data de 13/08/2023, a reportagem “UFF vai formar peritos independentes da polícia do Rio de Janeiro”. A respeito dela o SINDPERJ gostaria de esclarecer alguns pontos controversos, conforme o presente artigo e a nota em anexo:


1 – São Peritos Oficiais ou Assistentes Técnicos?


Os Peritos Oficiais de natureza criminal, conforme a Lei Federal nº 12.030/2009, só podem ingressar no cargo mediante concurso público, cargos estes que devem ter uma formação acadêmica específica de ingresso e, conforme o rol da mesma lei, compostos por Peritos Criminais, Peritos Legistas e Peritos Odontolegistas.

Já a figura do assistente técnico foi uma inovação introduzida no Código de Processo Penal (CPP) em 2008 pela Lei 11.690, nos parágrafos 3º ao 7º do art. 159. Os assistentes são contratados pelas partes do processo e produzem pareceres técnicos, em suma, são como se fossem “peritos particulares”, enquanto os Peritos Oficiais produzem a prova imparcial para o Juiz.

Esclarecida essa distinção, o que se propõe o curso de extensão a ser oferecido pela Universidade Federal Fluminense, com o apoio do Ministério da Justiça, nada mais pode ser do que a formação de assistentes técnicos, possibilidade prevista no CPP desde 2008.

Todo servidor público é passível de avaliações e críticas, e quando as mesmas são construtivas, técnicas e leais são bem-vindas, até necessárias. Assim, um assistente técnico não pode se portar nem ser visto como um fiscal opressor, ou um profissional sem ética. Inclusive, muitos avanços na perícia se deram não por iniciativa ou políticas de segurança pública, mas por pressões externas da sociedade, como já se deu em casos envolvendo assistentes técnicos, como o caso O.J Simpsons nos EUA.

Contudo, conforme exposto, é atécnico chamar o assistente técnico de “perito independente”, termo cunhado pela imprensa. É o mesmo que uma das partes chamar de Delegado Independente o seu advogado. Entendemos que o termo não foi cunhado pela UFF, instituição pela qual temos muito respeito, que inclusive formou muitos de nossos Peritos Oficiais e os qualifica em seus cursos de pós-graduação.


2 – E por que isso agora? Há algum motivo para isso?


Não podemos ignorar os possíveis motivos que levaram a essas e outras iniciativas: o Rio de Janeiro é um dos poucos estados da Federação em que a Polícia Científica integra a Polícia Civil, ao mesmo tempo em que o nosso índice estadual de letalidade policial é considerado alto e a nossa taxa estadual de esclarecimento de homicídios é considerada baixa.

Os Peritos Criminais e Legistas do RJ possuem formação superior específica na área científica afim, foram selecionados por um difícil e disputado concurso e foram capacitados nas Ciências Forenses – além de que, por meios próprios, se qualificam continuadamente. Esses profissionais são sim imparciais, mas entendemos a preocupação da sociedade civil organizada quando há notícias de que a Secretaria de Polícia Civil atribui perícias a outros cargos sem atribuição legal para tal, também sem a devida formação superior específica. O que foi sempre denunciado e combatido pela classe de Peritos Oficiais, que entende que a qualidade e confiança da Perícia são comprometidas por essa prática.

E quando instituições governamentais e da sociedade civil cobram a regularização dessas questões, o Estado (Executivo e Legislativo) promove a transformação de cargos de natureza diversa em cargos periciais, sem considerar a Lei Federal, e, num segundo momento, sem discutir as atribuições dos cargos, sem discutir a formação superior específica dos cargos, sem planejar uma distribuição justa e racional do trabalho. Assim, em vez de identificar e corrigir os erros, os mesmos são tão somente legalizados.

Essa mesma sociedade civil organizada observa que há unidades em que os Peritos Oficiais são subordinados diretamente ao mesmo Delegado que requisita a Perícia. Também observa a sobrecarga de trabalho (hoje somos 548 peritos dos 1035 previstos em lei), a não regulamentação da carga horária exclusiva para elaboração de laudos, como previsto na Lei 12.030/2009 e na LC 204/2022, o que submete os peritos ao dilema de ou elaborarem os laudos mais rápido que uma redação do ENEM ou serem punidos, com a perda do salário até a impossibilidade de se aposentar.

Observa que os peritos trabalham em ambientes de insalubridade máxima, com contato com cadáveres e sangue, como amplamente divulgado na imprensa, enquanto recebem apenas 33 reais de insalubridade, valor que não dá sequer para comprar um antibiótico. A sociedade observa que os peritos trabalham de plantão à noite, mas não recebem a mais por isso. A sociedade sabe que o trabalho científico de alta qualificação demanda profissionais com Mestrado e Doutorado, porém os peritos são os únicos servidores técnicos-científicos que não recebem adicional de qualificação e nem a possibilidade de uma licença para estudo.

Assim, a sociedade percebe que mesmo um perito capaz e imparcial tem o seu trabalho limitado, não pela vontade, mas pela falta de meios, de equipamentos, de condições de trabalho.

Também não é coincidência que nosso estado seja duramente criticado por uma política de segurança com muito confronto e pouco resultado, uma vez que é o estado em que sua Secretaria de Polícia é frontalmente contrária à Autonomia da Perícia – como já ocorre em 20 estados do país; e onde em 2001 e 2014 o estado majorou o índice remuneratório dos demais cargos da Polícia, menos o dos Peritos Criminais e Peritos Legistas, e a intenção talvez seja repetir isso novamente.

Agora devemos nos perguntar: e se o Ministério da Justiça, ao invés de doar essa verba à UFF, a tivesse doado para a SEPOL investir na Perícia? Será que a verba iria realmente ser investida na Perícia? O histórico aponta que não. Recentemente a SEPOL preferiu devolver milhões de reais para a União em vez de investir num centro de pesquisa dedicado à Perícia, com projeto já pronto. Outras verbas destinadas à Perícia também foram perdidas no passado por ineficiência administrativa da SEPOL, que é a única responsável pela gerência das verbas destinadas. Há muitas prioridades para a SEPOL, a Perícia não é uma delas.


3 - Então o problema não são esses assistentes técnicos?


Diante desse quadro aterrorizante, mesmo que o Ministério da Justiça externasse algumas preocupações e recomenda-se um pouco mais de autonomia para os Peritos na SEPOL, apenas um pouco mais, muito provavelmente a resposta da instituição seria negativa. A Corte Interamericana de Direitos Humanos, as Nações Unidas, a ALERJ, a Comissão da Verdade, o Ministério dos Direitos Humanos, a ABC, e inúmeras outras instituições, já externaram essa necessidade no passado e foram ignoradas.

O problema não é a capacidade nem a imparcialidade dos Peritos, o problema são as mazelas da Polícia. Com ou sem assistentes técnicos, a Perícia continua sistematicamente sendo sucateada, como política pública de segurança assumida pelo Governo do Estado.

O SINDPERJ continuará a denunciar e combater essa situação em que se encontra a Perícia em nosso Estado. Na discussão da Lei Orgânica da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro o SINDPERJ batalhou muito para mudar alguns desses pontos, garantindo um pouco mais de qualidade ao trabalho pericial e às perícias, e não vamos parar! Por isso, Perito Oficial, é necessário dar força ao Sindicato, é necessário comparecer nas atividades e se associar. O sindicato somos todos nós, voz e força!


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